segunda-feira, 29 de novembro de 2010

A cidade dos sonhos perdidos


Caminhou rua a rua
até que a força lhe falhasse
seca de lágrimas
consumida pelo frio
caminhou sem destino
a procura do incerto

De tantas voltas dadas
perdeu-se em ruas desiguais
de casas burguesas
em olhares estranhos
fez o conforto
do desconforto

Nas primeiras neves
de um inverno esquecido
enterrou sonhos, sorrisos
esmigalhou os pés
até lhe gelarem as entranhas

Seguiu caminho
por um vale desprotegido
em que um rio tímido
gemia ao ser fragmentado
por uma represa
que lhe tirava a liberdade

Nessa cidade
ficaram os seus passos
gravados em cada ruela
os seus cabelos
fragmentados pelo vento
espalhados no incerto

A certeza de não voltar
ficou escrita na despedida
esquecera os sonhos
à medida que foi perdendo
a luta contra o tempo

terça-feira, 23 de novembro de 2010

As linhas das sombras

Foto:Carlos Cascalheira "O maltês"

De linhas de sombras
fez um caminho incerto
entre ruas e ruelas
deixou rastos
de uma vida por viver

Invísivel ao mundo
deslizou de alma sem corpo
corpo roubado
olhar tremido
sorriso esquecido

Ainda hoje ao anoitecer
se ouvem suspiros
que se confundem
com brisa nocturna
suspiros de uma sombra
de cores rompidas
pelos dedos de vidas passadas

Existe sem corpo certo
no vulto de todo
o amor despigmentado
entre as linhas de sombras
que procuram as suas cores
as cores do amor

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Intensamente

Intensamente tocar
numa alma
esquecida pelo tempo
orquídea selvagem
olhar de fogo
mulher ardente
relâmpago em alto mar
indomável no ser
incomparável no sentir
das mil e uma noites
renascida
flor de amor
veneno em boca
doce tentação
breve e longínqua ilusão
de um coração preso
que ama sem razão
cega de amor
amor
com sabor
o teu sabor


sábado, 13 de novembro de 2010

Ponto (in) finito

Num ontem
de um tempo apressado
no limite da entrega
dois pontos se cruzaram
da base de sentimentos
frescos, leves
nasceu uma linha única
irregular, curva
que deslizou evitando
obstáculos imprevistos
lentamente deixou rasto
de poeira de sonho

A distância percorrida
foi aumentando
a linha foi enfraquecendo
as bases desaparecendo
apenas um dos pontos
se manteve imóvel
apenas um dos dois
acreditava, existia

De dois pontos
nasceu tudo
sem o preverem
num ponto (in) finito
perdeu-se tudo
sem o travarem

Na linha desse sentir
o querer insiste
o querer persiste
no ponto do limite
da uma boca
no reencontrar sem limite
do céu
de dois olhares


quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Sorriso usado

O vento revolto
gemeu a volta das árvores
destemido
rasgou folhas
arrancou raízes
levou o resto
de uma primavera florida

Correu numa calçada
assombrada pela noite
a chuva afogava a terra
que gritava de sufoco
em mágoa
ali ficou
alheia a tudo
num mundo de tristes
fez o seu esquecimento
no desprezo
de respostas negadas
no deixar de ser
sem sequer ter sido
capaz de amar

Triste ser
coração de pedra
olhar vazio
sorriso usado
e esquecido

sábado, 6 de novembro de 2010

Palavras que tocam

Num tremer de dedos
descontrolado e constante
entre lágrimas e suspiros
escreveu palavra a palavra
o que no coração guardava

Longe estava o tempo
em que sonhava
com o amor
escolheu viver
viver de amor
saboreando cada momento
mesmo que por vezes
o amargo lhe fica-se
travado na boca
no intervalo de um beijo

Um beijo de vida
de suave carinho
num leve tocar
nas ondas de um corpo
tímido, despido
no sentir de silêncios
compassadamente mágicos

Amou
entre cada pausa
de dois olhares
desenhou na pele
símbolos eternos
da entrega
de duas almas
com tempo

Sentiu amor
em cada despertar
em cada adormecer
por simplesmente
amar
num mar de amor
com limite
na linha de uma boca
de sal
o tempero
da vida

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Despertar sentido

Sentidos adormecidos
calcificados
mumificados
pelos rios de lágrimas
de dúvidas sentidas
no rosto de um ser
que nasceu do viver

Gravou palavras
queimou noites
soltou gemidos
nunca ouvidos
pouco entendidos
nas entrelinhas ficou
o que não quis mostrar
fechou-se em copas
numa caixa
feita papel rasgado
de desamor
perdido no tempo

De sentidos adormecidos
caminhou suavemente
abriu os olhos
numa madrugada
em que o sol queimou os céus
aquecendo-lhe o corpo
sentiu-se renascer
num calor
que lhe percorreu a pele

Sentiu vida
dentro de um coração
que sempre bateu
em silêncio

Bate coração
desperta-me os sentidos
leva-me
prende-me
nesta liberdade
que se tatuou
em tinta de dedos
num toque
apenas teu
e meu